Nutrição geral

Curcumina: a “arma secreta” da curcuma (?)

Em primeiro lugar gostaria de começar este post por destacar algo que me parece importante. Há 2 tipos de açafrão, o “tradicional”, mais usado em Portugal, que é recolhido a partir de umas flores, e o açafrão-da-terra (uma raiz da família do gengibre), que também pode ser chamado de curcuma e que tem sido bastante falado nos últimos tempos, e que será o “protagonista” deste post.
A curcumina é uma substância que existe principalmente no açafrão-da-terra, também conhecido como açafrão-da-índia, açafroa, gengibre amarelo, turmérico ou curcuma, e que tem merecido muita atenção por parte de quem procura perceber de que forma a alimentação pode ser um aliado para promover a saúde. Neste caso em particular, o interesse tem sido muito, pois foi observado que a curcumina parece influenciar vários processos relacionados com muitas doenças. Mais concretamente, tem sido proposto que esta substância tem potencial anti-inflamatório, antioxidante, anticancerígeno, antivírico e promotor da saúde cerebral. Devido a isso, tem sido destacado o seu papel como possível aliado em diferentes doenças, tais como doenças gastrointestinais, metabólicas, da pele, cardiovasculares, neurodegenerativas, autoimunes, psiquiátricas, bem como vários tipos de cancro. No entanto, apesar do entusiasmo inicial, que, em muitos casos, ainda persiste, os resultados continuam a ser pouco consistentes. Com base no conhecimento atual, as evidências mais relevantes são as que relacionam o consumo de curcumina com benefícios em pacientes com artrite, dor e síndrome depressivo.
Independentemente dos efeitos que a curcumina pode ter no nosso organismo, há um aspeto que parece ser crucial para avaliar o seu (real) impacto na nossa saúde. A biodisponibilidade é muito baixa, ou seja, do total de curcumina que ingerimos, apenas uma pequena parte é absorvida no intestino e utilizada pelas nossas células. Por muito benéfica que esta molécula seja, na realidade mais de 90% acaba por ser excretada nas fezes. Mas será que isso significa que não se pode tirar partido da curcumina? Não necessariamente, pois há algumas estratégias que podem ser adotadas para aumentar a biodisponibilidade da curcumina. A combinação da curcumina com outras substâncias pode ajudar a este nível, mais concretamente, a combinação com piperina, uma substância existente na pimenta preta. Infelizmente, o aumento conseguido ainda não foi devidamente estudado em humanos.
E se apesar da sua baixa biodisponibilidade, a curcumina tiver na mesma vários efeitos benéficos? Parece confuso mas não é… Há cada vez mais gente que defende que os potenciais benefícios da curcumina podem passar por alterar a saúde e a funcionalidade do sistema digestivo. Uma vez que alterações no sistema digestivo e, mais concretamente, na microbiota intestinal (mais informações neste post), parecem estar relacionados com a saúde do nosso corpo de uma maneira geral, não é de estranhar esta associação.
Recentemente foi divulgado um trabalho no qual foi analisada a evidência atual relativa ao impacto que a curcumina tem na saúde gastrointestinal. Foi proposto que a composição da microbiota intestinal se altera na presença dessa substância, diminuindo a inflamação e o risco de infeções.
Parece-me perfeitamente aceitável que a curcumina possa ter vários potenciais benefícios no nosso organismo. Ao mesmo tempo, também acredito que esses benefícios passem, pelo menos em parte, pela manutenção da saúde e função gastrointestinal. No entanto, acho pouco provável que todos os potenciais benefícios da curcumina possam na realidade dever-se a este efeito, ou seja, eventualmente nem todos estarão relacionados com a mesma forma de atuação da curcumina. Parece-me claro que os dados atuais ainda são muito pouco conclusivos, e que com base nos mesmos ainda não estamos em condições de afirmar sem dúvida quais os reais benefícios da curcumina, e qual a forma e quantidade que deve ser ingerida. Devemos ter sempre em consideração que uma coisa são os resultados obtidos com células ou com animais, e outra coisa é o que se passa na realidade no nosso corpo. Ainda por cima trata-se de uma substância que está presente num alimento que não é usado em grande quantidade aqui em Portugal. Resumindo, é uma molécula interessante, com potenciais benefícios, mas claramente faltam estudos que comprovem com rigor esses benefícios. Pode ser que no futuro algumas das questões levantadas neste post sejam esclarecidas…

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